Da metalurgia aos têxteis ou ao vinho, todos os sectores vêm o acordo do Mercosul como uma porta aberta a novas oportunidades de negócio num momento crítico. Todos os olhares se voltam para o Brasil
in Expresso, por Margarida Cardoso, 06-12-2024
Numa altura em que o mundo está a mergulhar “numa onda de protecionismo”, as empresas portuguesas veem o acordo do Mercosul como uma “oportunidade ímpar” para o reforço do relacionamento entre a União Europeia e os países do Mercosul – Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai. Representa “uma oportunidade ímpar para aprofundar laços com mercados relevantes e dinâmicos, criando condições para o crescimento económico, a internacionalização das empresas, a competitividade”, diz ao Expresso Luís Miguel Ribeiro, presidente do Conselho de Administração da AEP – Asssociação Empresarial de Portugal.
Na análise do dirigente associativo, o acordo político alcançado esta sexta-feira entre a União Europeia e o Mercosul vai “potenciar a integração de cadeias de valor, permitindo que empresas portuguesas possam aceder a matérias-primas e exportar produtos com custos mais baixos, ou expandir a sua produção” e representa “uma oportunidade para Portugal e as nossas empresas se posicionarem como parceiro estratégico na ligação entre a Europa e o Continente Sul e Centro Americano”.
No prato da balança, pesa a favor de Portugal e das suas empresas exportar a custos mais competitivos com redução ou até eliminação de tarifas e diversificar mercados para destinos extra-europeus, num momento “absolutamente crítico face à evolução desfavorável nos nossos principais parceiros comerciais, nomeadamente França e Alemanha”, sustenta.
Investimento também é oportunidade
Apesar da polémica que envolve o acordo, em especial entre os agricultores franceses, Luís Miguel Ribeiro destaca a porta aberta em sectores tão distintos como os vinhos, azeite e outros produtos alimentares, o têxtil, o farmacêutico e o tecnológico, entre outros. Mas a AEP também espera impactos positivos na componente do investimento, da agroindústria à construção e engenharia, energia, tecnologia e inovação.
E se estão em causa quatro países, os portugueses pensam antes de mais no Brasil. No caso do sector dos vinhos, que tem lá o seu terceiro mercado, ou o primeiro quando o Vinho do Porto não é considerado, “está em causa um acordo muito vantajoso que pode trazer boas oportunidades de exportação, uma vez que as taxas de importação do país mais do que duplicam o preço de uma garrafa de vinho”, comenta Frederico Falcão, presidente da Viniportugal. É verdade que as certificações de vinho biológico não são reconhecidas, mas “está em causa apenas um nicho de mercado”, refere.
Vender, mas também comprar como oportunidade
Mário Jorge Machado, presidente da ATP – Associação Têxtil e Vestuário de Portugal recorda que este acordo é “desejado há muito pela Euratex (a confederação europeia do sector) e pela indústria nacional porque significa novas oportunidades de abordagem do mercado brasileiro, onde a presença do velho continente é reduzida, até pela força da indústria têxtil local, mas há um enorme potencial de crescimento lá, em especial com preços mais competitivos”.
No caso da AFIA, associação do sector dos componentes automóveis, o presidente José Couto refere que as exportações da fileira para o Mercosul estão limitadas a 1%. “Mas estamos a falar, atualmente, de direitos aduaneiros da ordem dos 35% que inviabilizavam o nosso crescimento. A partir de agora, pode ser diferente. Temos de reconhecer que ganhamos aqui uma oportunidade importante em termos de mercado, mas também em termos de fornecimento de algumas matérias-primas cruciais como o níquel, o lítio e alguns elementos de terras raras”, nota.
França pode atrasar oportunidade
Na metalurgia, campeã das exportações nacionais, o momento também é de celebração da abertura para chegar a um mercado de 700 milhões de consumidores após mais de duas décadas de negociação. “Este acordo pode ser muito relevante num mundo cada vez mais polarizado entre os EUA e a China”, comenta o vice-presidente da associação sectorial AIMMAP sobre um acordo que traz redução de tarifas comerciais, facilita o investimento entre os dos blocos signatários e “poderá e deverá contribuir para mitigar os efeitos negativos que o mundo aguarda da política altamente restritiva na nova era de governação Trump”.
“Sem dúvida que devemos esperar um crescimento do comércio entre os dois continentes e Portugal pode tirar grande vantagem disso pela grande proximidade cultural e histórica que tem com o continente sul americano, em particular com o Brasil”, acredita.
No entanto, nota que a implementação do acordo “pode não ser tão rápida como desejamos, até porque a França, que tem mostrado alguma resistência, entra agora num novo período de instabilidade política”.