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Presidente da francesa PSA tem visão crítica sobre carro elétrico

O carro elétrico é o assunto do momento na indústria automobilística.

in Valor Económico, por Marli Olmos, 23-02-2018

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Tavares: indústria e governos não têm, ainda, respostas para várias questões.
A principal delas: quem vai pagar a conta?

 

Na Europa, Estados Unidos e China, montadoras trabalham com cronogramas apertados de lançamentos e algumas já fixaram datas para ter toda a linha eletrificada. O grupo francês PSA Peugeot Citröen também faz planos nesse sentido. Mas o presidente mundial da companhia, Carlos Tavares, tem uma visão crítica. Para ele, o automóvel elétrico transformou-se numa bandeira eleitoral em várias cidades do mundo. Mas, o pior, diz, é que nem indústria e nem governos têm, ainda, respostas para uma série de questões. A principal delas: quem vai pagar a conta?

Tavares prevê que com o fim do motor a combustão, os governos vão buscar uma forma de compensar a perda de receita obtida com impostos que incidem sobre combustíveis. Isso pressupõe, diz, uma transferência de receita pelo Poder Público. Assim, se hoje, em países como Estados Unidos, o consumidor chega a ganhar do governo bônus em torno de US$ 8 mil na compra de um elétrico, amanhã, ele poderá pagar uma conta de energia mais cara.

Nos países desenvolvidos, autoridades públicas impõem regras cada vez mais rígidas e fixam datas para eliminar veículos a combustão das ruas. Apenas carros elétricos poderão circular em Paris a partir de 2030, por exemplo. Para o executivo, os governos deveriam igualmente revelar com antecedência como pretendem fazer a composição orçamentária sem os impostos dos combustíveis fósseis.

Tavares também traz à tona questões levantadas por muitos especialistas, como a incoerência de estimular o veículo elétrico em regiões que geram energia em termoelétricas, que usam carvão. Sem contar o despreparo mundial para a reciclagem das baterias.

Nem todos pensam igual. Em entrevista durante o salão do automóvel de Detroit, em janeiro, a vice-presidente do programa global de veículos elétricos da General Motors, Pam Fletcher, fez ponderações nesse sentido. Segundo a executiva, baterias utilizadas em veículos podem, posteriormente, ainda abastecer outros equipamentos, como geradores. Em relação ao uso de carvão para gerar energia em alguns locais, ela disse que é mais fácil despoluir uma usina termoelétrica do que fazer o mesmo num centro urbano congestionado de veículos.

Tavares levanta a questão também da infraestrutura, indisponível ainda principalmente nos países menos desenvolvidos. “Existe uma pressão populista. Mas de nada vai adiantar empurrarmos esses veículos no mercado se o consumidor não tiver onde recarregar as baterias”, destaca. Para ele, em muitas cidades do mundo, o carro elétrico “virou propaganda eleitoral”.

A China está na liderança dessa mudança de matriz energética mundial e pretende ser o maior produtor de veículos elétricos do mundo. Para não ficar para trás, a Europa segue regulamentações semelhantes. A situação, afirma Tavares, empurra toda a indústria para a eletrificação e para um dilema: Quem não reagir para alcançar a China não participa do jogo, mas quem investir na nova tecnologia corre o risco de quebrar. “Os que não conseguirem se enquadrar nas regras de emissões serão punidos com multas e terão que se ajoelhar para ser comprados por outros”, destaca.

Tavares é também presidente da Associação Europeia dos Fabricantes de Automóveis (Acea na sigla em inglês). Segundo ele, na Europa quase não há conversas entre a indústria e os governos a respeito do assunto. Ele diz temer, no entanto, que com a mudança algumas empresas do setor desapareçam. “Essa transição energética é apaixonante, mas o alcance de alguns objetivos vão além da capacidade de algumas de nossas empresas”, diz. “É como no princípio de Darwin: quem não se enquadrar não vai sobreviver”.

Aos 59 anos de idade e 35 de carreira na indústria automobilística, incluindo um emprego no grupo Renault, rival da PSA, o português Carlos Tavares assumiu o comando da PSA há quatro anos e, ao colocar a lucratividade acima da meta de vendas, transformou a companhia numa das montadoras mais rentáveis do mundo. Com o caixa reforçado, a PSA anunciou, em março do ano passado, a compra da Opel e da Vauxhall, antigas divisões europeias da General Motors. O negócio envolveu EUR 2,2 bilhões.

A compra notabilizou Tavares, hoje uma das lideranças mais respeitadas pela comunidade automotiva. Com a inclusão da Opel e Vauxhall, as vendas mundiais da PSA registraram um aumento de 23,8% no terceiro trimestre de 2017 em comparação com o mesmo período de 2016. O relatório referente ao ano passado será divulgado no dia 1º de março.

Recentemente, Tavares decidiu vistar as fábricas da Opel, na Alemanha, e da Vauxhall, no Reino Unido. Concluiu que falta eficiência nessas operações. Segundo o executivo, não se trata ali de cortar empregos ou salários, que são mais baixos do que na França, mas de remodelar o sistema produtivo por meio de linhas de montagem mais compactas e um sistema logístico mais eficiente, entre outros.

Com uma fábrica instalada em Porto Real (RJ) desde 2001, Peugeot e Citröen somam uma participação pequena no mercado brasileiro (menos de 2%). Tavares reconhece que é muito pouco, mas o satisfaz o fato de o grupo francês ter revertido o prejuízo na América Latina há dois anos. Apesar disso, continua operando no vermelho no Brasil. Para ele, o resultado na região, apesar de positivo, está “vulnerável”. Ele anunciou que em breve modelos Opel importados serão vendidos no Brasil.

Tavares passou dois dias no Brasil esta semana. Durante encontro com diretores e gerentes da companhia, em São Paulo, na quarta-feira, alguns o questionaram sobre a baixa participação do grupo no Brasil. O executivo repetiu o que costuma dizer aos funcionários em qualquer parte do mundo: “O importante é ter lucro e não afagar o ego do Carlos Tavares”.

 


 

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