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Peças Auto – Made in Portugal

Reconhecida internacionalmente pela sua qualidade, a indústria nacional de componentes auto fornece peças para quase todos os modelos de automóveis fabricados na Europa e para muitas marcas aftermarket. Dinâmica e inovadora, encontra nos recursos humanos de excelência e na flexibilidade produtiva vantagens competitivas, mas não está alheia aos desafios da economia global.

in Turbo Oficina, por Andreia Amaral, Fevereiro 2016

Dos interiores de diversos veículos de sonho da Porsche, Ferrari e Jaguar, passando pelos avançados head-up displays dos novos Mercedes, BMW e Audi, aos inúmeros componentes de motor, direcção e suspensão, sem esquecer os pneus e painéis dos mais diversos carros, existe todo um universo de peças que são produzidas em território luso e que integram as linhas de montagem mundiais. Do mesmo modo, também muitas das peças e componentes que se podem encontrar no aftermarket têm assinatura nacional.

Como noutros sectores de actividade, também na indústria automóvel o selo “Made in Portugal” passou a ser reconhecido nos palcos internacionais como símbolo de qualidade, trazendo cada vez mais negócios e abrindo uma janela de oportunidade para capitalizar as competências ao nível da inovação e flexibilidade que todos elogiam. O ímpeto tem sido de tal dimensão que, apesar da quebra de 25% registada entre 2007 e 2009, nos últimos 15 anos esta indústria cresceu 200%, impulsionada por um investimento que só nos últimos cinco anos atingiu os 1,5 mil milhões de euros.

Para se ter a noção da representatividade deste sector na economia portuguesa, importa referir que, em 2015, o mesmo foi responsável por um volume de negócios de oito mil milhões de euros, um crescimento de 5,4% em relação ao ano anterior. Representando 4,4% do Produto Interno Bruto, a actividade é uma das que mais contribui para o volume de exportações de bens transaccionáveis (13,4%), ao encaminhar para outros países mais de 80% da sua produção. As 200 fábricas de componentes para automóvel que constituem o sector empregam ainda 42 mil pessoas, assegurando 6,5% do emprego na indústria transformadora.

UM SETOR ALTAMENTE PROFISSIONALIZADO

“Portugal tem uma força de trabalho forte, empenhada e produtiva, com um alto nível de educação em áreas orientadas para o negócio”, sublinha Nines Garcia, Diretora da Delphi Product & Service Solutions para Espanha e Portugal. A responsável desta empresa, que só em Portugal tem três fábricas, enaltece, ao nível dos recursos humanos, factos como: 61% dos portugueses falarem pelo menos uma língua estrangeira e terem uma performance a matemática superior à média europeia, a existência de escolas de gestão de elevada qualidade no país e o excelente desempenho de cientistas e investigadores. Além disso, de acordo com Nines Garcia, “a qualidade dos fornecedores portugueses alcançou standards internacionais. Todas as empresas já têm a certificação ISO 9001 e a maioria já obteve a especificação técnica para a indústria automóvel ISO/TS 16949 e a certificação ambiental”.

Segundo revela Jorge Castro, responsável da Dalphi-Metal Portugal, os processos implementados evoluíram muito com a implementação das OEMs em Portugal, já que estas “provocaram um fenómeno de arrastamento de empresas internacionais, para investirem localmente, e de empresas nacionais, cujo início de negócio com estas unidades foi a porta de entrada para internacionalizar a sua actividade para outras fábricas dos mesmos clientes”. Houve, por isso, e desde sempre “um esforço conjunto de desenvolver os standards de funcionamento das empresas para o nível requerido nesta indústria”. Na opinião deste gestor, existem, contudo, outros factores que contribuem sobejamente para o sucesso da indústria de componentes automóveis. “A vontade empreendedora, o custo controlado, a estabilidade social, a qualificação de pessoal, são condições relevantes”, refere.

A mão-de-obra altamente qualificada, motivada e com custos laborais competitivos é também destacada por Luís Filipe Villas-Boas, administrador da SLM – Schmidt Light Metal, Fundição Injetada, que refere ainda que o “historial exportador, o elevado grau de internacionalização, a tradição e longa experiência a lidar com múltiplos clientes em variados mercados”, como factores relevantes. Segundo este responsável, também “a capacidade de produção flexível e com disponibilidade para a mudança”, “os conceitos de gestão modernos (Melhora Contínua, Lean Manufacturing, 6 Sigma, TQM, etc.)” e o “fácil acesso aos mercados de Alemanha, Espanha, França, África e América Latina” têm potenciado o sucesso das empresas que se implementam em Portugal, seja com capital estrangeiro ou nacional.

Além disso, o responsável refere quem neste sector, “qualidade é encarada como prioritária, garantindo níveis de qualidade extremamente elevados nos produtos, nos serviços e nas organizações”.

ALTA VELOCIDADE

Face a uma cada vez mais feroz concorrência dos mercados de leste e do norte de África, com uma mão-de-obra com um custo tendencialmente inferior, o crescimento da indústria nacional de componentes para automóveis estará fortemente dependente da capacidade de se diferenciar por outros factores. Assim, e num sector onde inovação é a palavra de ordem, acompanhar o ritmo exigirá um grande investimento, não só em áreas como a investigação e desenvolvimento, como em tecnologia de ponta que permita a produção de componentes com maior valor acrescentado e em séries menores. Essa é precisamente a ideia da SLM, que identifica os seguintes desafios: “Continuar a investir em equipamentos para acompanhar as grandes tendências de evolução do sector automóvel; contribuir para a produção de peças mais leves e mais eficientes em termos energéticos e ambientais na utilização nos veículos, bem como na produção de novas gamas de peças mais complexas sempre tendo em conta a necessidade de redução do peso das viaturas.” Para ultrapassar estas questões é essencial, no entender deste responsável, “dotar o departamento de investigação de meios laboratoriais “state-of-the-art” que permitam criar factores distintivos face à concorrência; o aumento da produtividade, a manutenção das certificações de qualidade e ambiental; a diversificação dos clientes e a entrada em novos mercados”.

Contudo, Abílio Cardoso, CEO da Veneporte, indica que existem outros elementos que condicionam a competitividade do sector, nomeadamente, “o reforço da quota eléctrica, as mudanças nas exigências técnicas e a dimensão e periferia do país”, que aumentam, por um lado, os custos de fabrico e, por outro lado, os custos logísticos associados à exportação.

POSICIONAMENTO ESTRATÉGICO

Convicto de que “Portugal tem condições reunidas para se afirmar como um centro de competências”, na área dos componentes auto, o responsável da Dalphi-Metal Portugal, adverte que tal só será possível, “desde que se consiga a devida articulação dos diversos agentes do sector, como empresas construtoras de automóveis, empresas de componentes para automóveis, centros tecnológicos e de investigação, universidades, associações empresariais e outras entidades. Estando em curso a constituição de um Cluster Automóvel a nível nacional, esta é uma oportunidade única de conseguir essa articulação, e conseguir as sinergias necessárias para que este sector se afirme ainda mais a nível internacional como um local competitivo e de excelência”.

Jorge Castro refere também que a perspectiva para o sector de componentes para a indústria automóvel em Portugal será de crescimento, desde que o mercado internacional evolua favoravelmente e que seja devidamente cuidado e apoiado pelas entidades competentes. Pelo seu efeito “âncora” e multiplicador, seria de grande interesse captar para Portugal o investimento de uma nova OEM de relevância, que se traduziria num impacto muito positivo neste importante sector”.

Por seu lado, Nines Garcia, Diretora da Delphi Product & Service Solutions, referenciando o programa mobi.e e o facto de Portugal ter almejado o primeiro sistema de mobilidade eléctrica interoperável, afirma: “unindo esforços entre empresas da indústria automóvel, da energia, das Tecnologias de Informação e Comunicação e de Investigação e Desenvolvimento, Portugal é um ambiente natural para o desenvolvimento e teste de novas soluções de mobilidade e serviços adaptados para o futuro das cidades.” Além disso, a responsável acredita que um cluster emergente em torno de novos conceitos e serviços de mobilidade está a gerar a liderança mundial das empresas portuguesas e atrair a parceria de grandes corporações”.

OPORTUNIDADES TRANSATLÂNTICAS

Ainda em fase de discussão, o Acordo de Parceria Transatlântica de Comércio e Investimento entre a União Europeia e os Estados Unidos da América poderá abrir as portas de novos mercados para a indústria nacional de componentes auto. O TTIP (sigla inglesa para Transatlantic Trade and Investment Partnership) pretende eliminar barreiras comerciais, aduaneiras e não aduaneiras, aplicadas sobre uma vasta gama de sectores da economia, facilitando a compra e venda de bens e serviços por empresas, nos dois mercados. O acordo comercial deverá, deste modo, assegurar uma redução generalizada de tarifas, facilitando as exportações, ao mesmo tempo que permitirá harmonizar as diferenças de regulamentos técnicos, normas e procedimentos de aprovação e certificação de produtos e serviços, como aquelas que existem ao nível dos componentes auto.

Segundo um estudo do Centre for Economic Policy Research (CEPR), a eliminação das tarifas e de 10% das barreiras não tarifárias (procedimentos) representaria um aumento de 71% das exportações de veículos e peças da Europa para os EUA. Num cenário mais optimista, com uma mitigação de 25% das barreiras não tarifárias, as exportações poderiam ter mesmo um incremento de 149%. Por isso mesmo, a CLEPA, associação europeia da indústria de fabricantes de componentes auto, tem vindo a pressionar as instituições europeias no sentido de concretizar este acordo. Num outro estudo, o CEPR refere também que a economia portuguesa seria uma das que primeiro e mais beneficiaria deste acordo internacional.

Tendo isto em conta, Abílio Cardoso, CEO da Veneporte, considera que o TTIP teria impactos “bastante positivos” para a indústria nacional de componentes auto: “A maior colaboração entre UE e EUA é uma oportunidade interessante que pode potenciar novos negócios e criar as condições necessárias para um reforço da competitividade da indústria portuguesa nesses mercados.“ Do mesmo modo, também a SLM vê com bons olhos a concretização da parceria: “Deste modo resultarão ganhos económicos, maior criação de emprego, inovação e mais confiança dos investidores.”

 


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