Comércio externo Exportações para a Alemanha até setembro subiram quase 19% e ultrapassaram as vendas para França
in Expresso, por Margarida Cardoso, Sónia M. Lourenço, 22-11-2024
No meio de uma crise política e económica, a Alemanha está a preocupar a Europa, mas para as exportações nacionais o país tem vindo a destacar-se pela positiva em 2024. Até setembro, as vendas de bens para o mercado alemão deram um salto de 18,8%, o suficiente para este destino ultrapassar a França e ocupar o segundo lugar no ranking dos maiores clientes de Portugal, atrás de Espanha.
A subida na frente alemã, bem acima do crescimento de 2,2% das exportações lusas, é puxada em especial pela indústria química (+244,4%) e mais especificamente pelo segmento dos produtos farmacêuticos, que tem em Portugal pesos pesados germânicos como a Fresenius, Bayer ou Boehringer: “Só no terceiro trimestre, as vendas da indústria farmacêutica para a Alemanha somaram €800 milhões, o suficiente para o país passar a ser o maior mercado do sector, à frente dos Estados Unidos”, diz ao Expresso Joaquim Cunha, diretor-executivo do Health Cluster Portugal. “Falta ainda apurar se será um epifenómeno, ou uma tendência”, declara sobre a dinâmica que levou o sector a fechar setembro 40% acima do ano passado, quando em junho o crescimento era de 3%.
“Hoje, há muita subcontratação na fileira farmacêutica, nomeadamente por empresas alemãs, e Portugal parece estar a conseguir posicionar-se”, comenta Alberto Castro, economista e professor da Universidade Católica do Porto, numa altura em que a maior economia europeia vive uma crise política e económica.
As eleições antecipadas estão marcadas para fevereiro do próximo ano, depois de a coligação liderada por Olaf Scholz ter perdido a sua maioria parlamentar, com o afastamento do ministro das Finanças, Christian Lindner, do Partido Liberal-Democrata (FDP). Agora, as sondagens dão favoritismo aos conservadores da CDU, mas o partido de extrema-direita, AfD, pode assumir-se como o segundo maior partido do país, à frente dos sociais-democratas do SPD.
Depois de uma contração económica em 2023, a maior potência da região deverá voltar a encolher 0,1% em 2024, segundo a projeção de outono da Comissão Europeia, com um défice a rondar os 2% este ano e no próximo. E há um indicador que pode ajudar a explicar as atuais dificuldades do panzer germânico: o investimento público em percentagem de PIB foi de 2,5% entre 2018 e 2022, segundo a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE), o que representa a menor percentagem entre as economias mais evoluídas, apenas à frente de Espanha.
“As exportações para a Alemanha têm sempre um peso grande da Autoeuropa e como há problemas nas fábricas no país, Portugal poderá estar a produzir mais para lá”, diz ainda Alberto Castro. Já o presidente da AFIA, associação do sector dos componentes automóveis, trava o otimismo. “A Alemanha ainda é um mercado em crescimento, mas já se começa a sentir abrandamento na procura”, diz José Couto. A fileira irá terminar o ano no vermelho, em contraste com o crescimento de 13,7% de 2023. “Não esperávamos uma queda destas, ditada pela quebra do consumo, pelo facto de um automóvel europeu ser muito mais caro do que uma viatura importada da China, pela falta de infraestruturas de reabastecimento para os carros elétricos”.
No quadro geral das exportações, há sectores a vermelho, como o automóvel, à espera de fechar o ano a cair 5%, ou os têxteis, a admitirem uma quebra anual de 6%. Até a metalurgia, campeã das exportações nacionais, está em quebra, “a refletir a contração dos principais mercados”, diz a associação sectorial AIMMAP, deixando uma nota positiva para a subida de 10% das exportações em setembro, numa fileira de “empresas competentes, capazes de produzir com qualidade e inovação”.
Mas há, também, sectores à espera de bater recordes, como o farmacêutico ou os produtos alimentares, onde o azeite está em destaque depois de fechar setembro com um crescimento recorde de 58% na frente externa (€1,1 mil milhões), já acima do valor total de 2023, a refletir o aumento da produção na última campanha, a subida de preços e mais vendas a granel, explica Mariana Matos, secretária-geral da Casa do Azeite.
Quando analisa os números das exportações, Teresa Pinheiro, economista do BPI, não tem dúvidas: “O baixo peso e a evolução desfavorável das exportações de bens de elevada tecnologia no total exportado — em 2023 representavam 5,1% do total e em 2019 valiam 5,4% — são um ponto fraco”, mas a capacidade de penetração em mercados fora da União Europeia “está a melhorar” assim como “a diversificação de produtos, o que reduz a vulnerabilidade” do cabaz nacional. Ao mesmo tempo, as exportações de serviços já representam 43% do total (38,5% em 2019), puxadas pelo turismo mas também pelas Tecnologias de Informação e Comunicação (3,3% em 2024 vs. 2% em 2019) e pela prestação de serviços empresariais (7% em 2024 vs. 5% em 2019).
Este é um dos destaques positivos do antigo ministro da Economia Augusto Mateus, atento ao dinamismo da exportação de serviços, a beneficiar da “oferta de recursos qualificados nas universidades e da descoberta de Portugal por grandes empresas internacionais”. Já no que respeita aos bens, “o nosso posicionamento nas cadeias de valor internacionais sempre foi deficiente” e se o peso das exportações brutas no PIB ronda os 50%, “as importações que depois são exportadas representam 70% do total e o valor acrescentado no país é inferior a 1/3”, nota. O economista deixa ainda um alerta para o facto de a Europa estar a “perder competitividade em áreas-chave das exportações portuguesas”.
E o que dizer da subida de 9,9% nas exportações de minerais até setembro, combustíveis fósseis incluídos? A percentagem reflete crescimentos nas vendas relativas ao tráfego aéreo e ao turismo, explica a Epcol, que representa as empresas portuguesas de combustíveis e lubrificantes, mas também mais vendas na refinaria da Galp (+8%) face a 2023, ano em que houve duas paragens de manutenção em Sines.
Com Gonçalo Almeida