António da Silva Rodrigues, o presidente do Grupo Simoldes, que detém 34 empresas, 20 fábricas e três centros de engenharia em 15 países, não tem dúvidas quanto à exigência de 2023 em termos nacionais e internacionais: “O poder de compra vai cair. Por conseguinte, a economia não vai melhorar, vai piorar. Estagnar já não seria mau, mas acho que vai piorar.”
in Expresso, texto: Joana Nunes Mateus, foto Rui Duarte Silva, 30-12-2022
O grupo industrial, que se afirmou a nível mundial pela produção de moldes e também pela injeção de peças de plástico para grandes fabricantes automóveis, como Stellantis, Renault ou Volkswagen, está a investir em força na investigação e desenvolvimento de novas soluções para armazenamento de energia e mobilidade, integrando diversos consórcios no âmbito dos Planos de Recuperação e Resiliência (PRR) português e espanhol.
A Simoldes deverá fechar 2022 com um volume de negócios consolidado a nível mundial na ordem dos €626 milhões e com perto de 5200 trabalhadores. E quanto a 2023? “O cenário é bom na parte dos moldes. Na parte dos plásticos não tanto, atendendo à falta de componentes. Mas penso que, em princípio, não teremos grandes problemas, devido à carteira de encomendas que já temos para o ano que vem. Possivelmente, não será de crise. Até poderemos crescer”, diz António da Silva Rodrigues.
A fileira automóvel ainda não recuperou da disrupção da cadeia de fornecimentos global precipitada pela pandemia. “Nos últimos meses não tem havido tantas paragens como em meses anteriores. Mas não está normalizado. Hoje falta uma peça, amanhã falta outra”, alerta o industrial em relação à dependência da Ásia e à reindustrialização do Ocidente. “Se fosse fácil montar uma fábrica em meia dúzia de meses, o problema estava resolvido assim que a Europa trouxesse as peças do Oriente. Mas há indústrias que não se montam num mês ou num ano. Demoram o seu tempo. E a retoma da montagem de automóveis está relacionada com isso. Se fosse assim tão fácil, os americanos, que têm o mesmo problema, já o tinham resolvido.”
O conselho que dou aos novos? Que têm de trabalhar muito para conseguirem alguma coisa. E que sem responsabilidade não vão a lado nenhum
Espera alguma normalização? Só depois de a guerra acabar: “A guerra veio complicar tudo. Havia grande parte de componentes que se fabricavam na Ucrânia e noutros países afetados. Tudo se reflete na situação que está a acontecer. Eu gostaria que a guerra acabasse, mas não sei. Depende dos amigos do sr. Putin.”
DOUTOR HONORIS CAUSA
O industrial de 80 anos recebeu o Expresso na sede do grupo, em Oliveira de Azeméis, no dia 21 de dezembro de 2022, horas antes de receber o título de Doutor honoris causa pela Universidade de Aveiro. “Um empresário notável que criou do zero um grande grupo multinacional. Um grupo que, em percentagem do seu volume de negócios, investe mais em conhecimento e inovação do que muitos países”, justificou o reitor, Paulo Jorge Ferreira.
Ao professor José Martinho de Oliveira coube o elogio deste doutorando que criou a Simoldes Aços em 1959 e a Simoldes Plásticos em 1981: “Conciliou a escola com atividades agrícolas e com o descasque do arroz, o qual era realizado ilegalmente nos moinhos da aldeia, mas, como refere, ‘tolerado pelas autoridades’! Considerado pelo seu professor primário um ‘aluno brilhante’, o seu percurso escolar concluiu-se ao fim de quatro anos, o que, aliás, era prática corrente no seio das famílias mais modestas.”
O resto da história foi relatado ao auditório da Universidade de Aveiro pelo próprio empresário: “Quis o destino levar-me para uma indústria que estava ainda a nascer: os moldes. Fui o primeiro funcionário da Moldoplástico. Tinha 14 anos e, tal como na oficina do sapateiro, aprendi cada detalhe com o sr. Lúcio Rodrigues e o sr. Joaquim Landeau, artistas de topo da indústria do vidro que aplicavam agora o seu conhecimento nos moldes para plástico. Ainda antes de atingir os 18 anos, fundámos a Simoldes, numa pequena oficina com 80 metros quadrados. Éramos quatro colaboradores.”
Enquanto industrial “que se confronta permanentemente com a incerteza”, António da Silva Rodrigues listou os principais desafios enfrentados pela Simoldes nas últimas seis décadas: “As alterações cambiais antes da adesão ao euro; as crises do petróleo provocadas pela guerra Irão-Iraque; as guerras do Golfo Pérsico; a crise financeira de 2007-2008; a aplicação pela troika do programa de assistência financeira a Portugal; e o enquadramento económico e social muito desfavorável, decorrente da recente pandemia de covid e da atual guerra na Europa.”
Tenham esperança e arrisquem, mas não demais. Têm de dar passos curtos e seguros. Se derem um passo largo, pensem muito. O investimento pode ser de tal maneira que não dê para levantar novamente
Agora, “com características absolutamente excecionais e em nada por nós controláveis, os empresários têm de saber lidar, nomeadamente, com a subida dos custos das matérias-primas, energia e transportes, o aumento dos preços e dos juros, o cancelamento dos projetos e a paragem das fábricas”, alertou o empresário quanto à relevância das políticas públicas. “É muito importante prestar atenção à realidade atual das empresas portuguesas, providenciando o melhor apoio possível à sustentação da sua viabilidade e tesouraria, até porque é daqui que vem o crescimento, o emprego e a erradicação da pobreza.”
PÔR A ECONOMIA A CRESCER
“Nunca pensei que a Roménia nos ultrapassasse”, acrescentou António da Silva Rodrigues quanto à estagnação do processo de convergência da economia portuguesa com a da União Europeia. Para crescer mais, “Portugal precisa de produtos próprios para vender e criar riqueza. Ou então de arranjar parceiros que se instalem cá e desenvolvam a indústria”.
O industrial alerta que as empresas devem ganhar escala suficiente para abastecerem os mercados externos: “O Governo devia fazer um estudo. Ver as empresas que estão a ter sucesso e ajudá-las a expandir-se para alargar os produtos que temos para exportação. Ajudar as empresas que têm marca, que têm futuro, que têm possibilidade de se expandir e exportar. Isso é muito, muito importante.” Ou seja: “Devemos selecionar, ver as empresas que estão a progredir, que têm uma boa clientela e um bom produto e apostar nelas.”
https://www.simoldes.com/